Não apenas turistas, mas peregrinos

Entrevista com Frei Paolo Martinelli por ocasião do “Festival franciscano”, realizado em Rimini

“Começar consigo;sem que a meta seja si mesmo; conhecer a si, mas não se preocupar consigo mesmo. ”Sao Francisco certamente não leuO caminho do hememde Martin Buber (Qiqajon 1990), mas certamente caminhou ‘transcendendo’ a si mesmo.

Lê-se no comunicado do Festival Franciscano 2013, elaborado entre outros por frei Paolo Martinelli, capuchinho, presidente do Instituto de espiritualidade franciscana na Faculdade Antonianum, em Roma.

MSA (Menssageiro de Santo Antônio): O que significa caminhar para São Francisco?

Martinelli: Em sua experiência e na dos franciscanos, caminhar é um sinal de itinerância, isto é, da vida como itinerário, com uma meta e um destino: o mundo está passando, não é negativo, mas não é o objetivo final. Para certas filosofias o universo em si é negativo, mas não é assim em Francisco. Basta pensar no Cântico do Irmão Sol: a existência terrena, mesmo marcada pelo pecado, é vontade de Deus.

Atravessar significa não parar?

Sim, não parar: a melhor forma para viver no mundo é atravessá-lo, vivendo todas as circunstâncias com uma perspectiva final. O caminho é sempre sentido como antecipação do sabor da meta, onde as coisas são belas porque levam para outro lugar.

O objetivo, portanto, está além desta vida…

Definitivamente. A existência franciscana tem um valor escatológico, isso não significa automaticamente a vida após a morte: o que vivemos tem um significado que vai além do imediato.

O senhor mencionou a vida após a morte: muitas vezes é representada como fixo e imóvel. Nada a ver com o “caminhar” então…

Somos herdeiros de uma cultura que separou o elemento histórico do sobrenatural, por isso, mesmo a vida após a morte é apresentada como imponderável, estática e abstrata. Se fosse assim, também seria pouco desejável… Em vez disso, os santos nos dão uma percepção de Deus extremamente vital e vivo, portanto, o caminho que o homem percorre na existência, de alguma forma antecipa a existência de Deus, que é vida em si. Deus é a profundidade máxima de tudo que vivemos no mundo, justamente porque é a origem e o destino. A ideia da Trindade, um Deus que é comunhão, evento eterno de amor, tem uma radical atracão vital. Cria o mundo como exuberância de vida, tal como a liberdade que participamos.

Mesmo os cristãos são acusados de “estagnação “. Em qualquer caminho de peregrinação, evidente que sim, os cristãos estão a percorrer, mas também as pessoas que estão “em busca”, como se o cristão não procurasse mais nada.

A realidade é, paradoxalmente, o oposto. Ter descoberto a resposta oferecida por Deus sugere ainda mais apergunta, mas nãofecha a partida, que é continuamente despertadapelo encontro com o Senhor. Santo Agostinho compreendeu: a busca do homem em relação a Deus está continuamente aberta, porque Ele é infinito, nunca se torna um ‘conceito’ paracolocar nobolso.

O cartaz do Festival identifica três formas de caminhar: a do errante, a do turista e a do peregrino. Quais são as diferenças?

O errante não tem uma meta,o turista conhecea meta, mas não permite a mudança da viagem. Somenteo peregrinointerceptao trajetodo desejoprofundo, permanecendo fiel ao coração do homem. Nesta dimensão antropológica comum a todos, o cristão acrescenta um elemento: a peregrinação conta a verdadeira relação com Cristo, Aquele a quem deve sempre seguir e reencontrar.

Como cultivar um espírito de peregrino na vida cotidiana?

Através da pobreza, que é guardiã do espírito de itinerância. A alternativa é deter-se em algumacoisa ecriar uma meta falsa. Se nos prendemos em coisas, esperandooque não podem nos dar, no final,o caminho torna-se cheio de decepções.

Alberto Friso

(26 de Setembro de 2013) © Innovative Media Inc.